A casa
Há alguns meses Paulo, Angélica, Alexandre e Cybele, planejavam um fim de semana retirado da cidade.
Enquanto os quatro amigos conversavam na biblioteca, Cybele teve uma idéia.
- Olha gente, tem um feriado na quinta feira, daqui a duas semanas. A gente poderia aproveitar esse, emendamos tudo e só voltamos na segunda, que tal?
- Pra mim está ótimo – emendou Angélica.
- E o local? Perguntou Paulo.
- Isso deixa comigo. – completou Alexandre.
- Então tá, tá combinado – confirmou Cybele.
- Olha lá, pra onde você vai levar a gente. – disse Paulo.
- Ih, tá com medinho é? – disse Alexandre em tom de gozação.
- É claro que não, mas segurança em primeiro lugar.
- Já disse, não esquenta, vou arrumar um lugar legal.
- Deixem de conversinha e vamos, temos aula daqui a pouco. – disse Angélica.
***
Um dia antes, se encontraram para acertar os detalhes.
- Então pessoal, levem pouca coisa, quanto à comida, evitem os enlatados, pois fazem muito peso. – disse Alexandre.
- E para onde nós vamos? – quis saber Angélica.
- Vamos para uma cidade chamada Torre de Pedra, eu a achei no “Google Earth”. Lá, como o nome já diz, tem uma torre de pedra de formação natural. Fica bem afastada da cidade e na base da torre tem um barraco que era usado por caçadores, mas ninguém usa mais.
- E a que horas vamos sair? – perguntou Cybele.
- 06 horas.
- Hei Paulo. Volta pra Terra. – gritou Alexandre em tom de gozação.
- Hã? Pra mim, tudo bem.
Mas não estava tudo bem. Alguma coisa lhe dizia que aquilo não era uma boa idéia. E ele havia aprendido a respeitar sua voz interior.
Como certa vez, que ele trabalhava em uma serraria. Era um trabalho até fácil. Só tinha que engatar dois ganchos um de cada lado das toras, que estavam ligados a uma corrente que por sua vez, era içado através de um controle remoto. Como o cabo do controle era curto, Paulo tinha que acompanhar a tora de bem perto até a serra. Foi numa dessas que Paulo ouviu a voz:
“Pisa na outra tora” – ouviu na sua cabeça.
Parou todo sistema e olhou para traz, para os lados e não viu ninguém, achou que estava ouvindo coisas, voltou a acionar a máquina e novamente a voz, desta vez mais forte e imperiosa.
“PISE NA OUTRA TORA”
Desta vez foi tão forte que ele resolveu obedecer. No mesmo instante, ele ouviu um barulho de tecido rasgando. Eram os ganchos que prendiam a tora no ar que estavam escapando para, logo em seguida, cair exatamente onde ele estava. Depois disso, sempre prestava atenção em sua voz interior.
****
Saíram bem cedo, estava começando a clarear, ouviam e cantavam junto uma música dos Engenheiros do Hawaii, “... nem tão longe que eu não possa ver, nem tão perto que eu possa tocar...”, A montanha era o título da música, muito apropriado para o destino deles.
Já estavam na rodovia Castelo Branco quando bateu aquela fome.
Puxa vida, eu estou como uma fome, a última vez que tomei café da manhã foi ontem. – disse Paulo e todos deram risadas.
- Daqui a pouco a gente chega no Castelinho da Pamonha. Dá pra comer uns salgados e ir ao banheiro. – disse Alexandre
Após comerem, seguiram viagem, não demorou muito e já chegaram na saída de acesso à cidade.
- Bom, - disse Alexandre – agora a gente entra aqui e pergunta lá na cidade.
- Como assim “pergunta lá na cidade?” Você não disse que viu lá no mapa do Google? Disparou Cybele.
- É que... – começou a gaguejar Alexandre – Bem, é que no mapa estava visível só até aqui e na cidade. Na área da torre não aparece nas fotos do satélite, é como se ele não cobrisse esse pedaço.
- Muito engraçadinho não é seu Alexandre – reclamou Angélica.
Paulo começou a ficar inquieto com as novidades e aquela sensação estranha voltou a perturbá-lo novamente. Ele dizia pra si mesmo que aquele era seu “sentido de aranha”, igual ao filme.
****
A cidade era bem afastada da rodovia, mas foi fácil chegar lá. Depois de algumas perguntas, acharam o caminho para a tão falada Torre de Pedra.
Chegaram em um ponto em que o terreno era muito ruim e íngreme. Pararam em uma casa simples e perguntaram se tinha outra entrada.
- Tem não senhor. – respondeu o morador – é melhor vocês deixarem o carro aqui e seguirem viagem a pé.
- Fica longe?
- Dá uns 5 km de subida, depois fica planinho.
- Obrigado.
- Di nada. Vocês vão ficar na cabana do “véio Osmar?”
- Não sei se é a do “velho Osmar”, mas é isso aí. Ela tá abandonada, não é?
- É sim, à noite, fechem bem as portas e as janelas.
- Porque? – interveio Cybele.
- Ué porque? Pra mós dos bichos não entrá.
Angélica olhava Alexandre fuzilando-o com os olhos.
- Bom turma, ouviram o homem, peguem as mochilas e vamos. 5 km de subida vai levar pelo menos uma hora.
Os quatro acenaram para o homem, viraram as costas e se puseram a caminhar, nem perceberam que o homem balançava a cabeça em sinal negativo e se benzia, fazendo o sinal da cruz duas vezes.
Alexandre seguia na frente, em seguida Cybele, Angélica e Paulo fechando a fila.
Andaram vinte minutos e já estavam exaustos. Fizeram uma parada para descansar e tomar água. Prosseguiram a caminhada até chegarem na área plana, já dava pra ver a torre de pedra e a cabana. Já eram quase duas horas da tarde, mas decidiram parar para comer só quando chegassem na cabana. Quando chegaram, os rapazes saíram para catar lenha pra a lareira e para cozinhar, enquanto as moças ficaram preparando os utensílios para o almoço e a janta, que seria no máximo macarrão instantâneo e lingüiça defumada.
Deram uma volta à tarde, tinha um laguinho ali perto, mas nem pensaram em mergulhar, ali em cima fazia muito frio.
Paulo e Alexandre ficaram felizes por terem pegado bastante lenha, manteria a cabana aquecida. A noite chegou rápido e uma forte neblina começou a se formar e decidiram voltar para a cabana.
No caminho de volta à cabana seguiram a mesma formação da subida. Paulo como vinha atrás, ouviu um barulho às suas costas, quando se virou deu de cara com um garoto. Tinha mais ou menos 15 anos.
- Quem é você? Você mora por aqui?
O garoto, assustado com as perguntas, sai correndo e some em meio às árvores e a neblina.
- Hei! Espera aí.
- Estamos esperando. – gritou Angélica, já meio distante.
- Tinha um garoto aqui. – disse Paulo, meio ofegante.
- É. E quem era?
- Não sei. Quando perguntei o nome dele, ele saiu correndo.
- Deve morar por aqui e está curioso por ter alguém morando na cabana. Vamos logo, porque do jeito que está essa neblina, daqui a pouco a gente não acha nem a cabana.
Segundo as orientações do morador que ensinou o caminho, fecharam bem as portas e janelas.
Como estavam cansados dormiram profundamente. Fizeram um semicírculo em volta da lareira para se manterem aquecidos à noite. De madrugada, Paulo ouvira uma voz de mulher chamando seu nome, levantou e reparou que as meninas ainda dormiam, resolveu levantar e dar uma olhada lá fora e pensou ter visto o garoto novamente em meio à neblina que agora era bem mais densa.
No dia seguinte, Paulo percebe que Cybele e Angélica estão com um comportamento estranho, fazem de tudo pra que ele e Alexandre não saem de casa, inventam um monte de coisa para fazer e com insinuações acabam conseguindo. No final da tarde, Paulo aproveita um momento de distração das duas e sai da cabana pra dar uma volta e encontra o garoto um pouco distante da cabana, corre até ele e pergunta:
- O que você quer?
- Vocês têm que sair daqui.
- Porque?
- Por que é perigoso, vocês não deviam estar aqui, ela não vai deixar vocês irem.
- Ela quem?
- Não posso falar mais nada, ela não pode saber que falei com você.
- Ela quem? Espera aí.
O garoto corre novamente e grita antes de desaparecer atrás de uma árvore.
- Procure o retrato e destrua.
Paulo ficou meio assustado. Depois do episódio no parque de diversões, tem receio conversar com pessoas isoladamente.
Ao voltar para a cabana Alexandre está discutindo com as meninas.
- Porque temos que arrumar essa cabana? Ela nem é nossa e vamos embora depois de amanhã?
- É só pra ficar mais agradável. – disse Cybele em tom meloso.
- E você? Onde esteve?
- Fui dar uma volta.
- Venha tenho umas coisas pra você fazer.
- Não podemos fazer amanhã? Já está tarde.
- Tudo bem então. Mas nada de escapadinhas hein?
Todos jantam e se deitam, pois estão muito cansados. Paulo finge dormir e quando reina o silêncio, levanta e dá um cutucão em Alexandre tampando-lhe a boca e faz sinal pra que ele fique quietinho. Vão até a janela e Paulo fala quase sussurrando.
- Temos que sair daqui.
- Eu sei, eu tentei isso o dia todo.
- Não, você não entendeu, temos que dar o fora, puxar o carro.
- É, você tem razão. Isso não é o fim de semana que eu planejei, to só trabalhando.
- Temos que achar uma coisa antes.
- O que?
- Um retrato.
- Pra quê?
- Olha xande, eu vim até aqui com você sem fazer perguntas, é agora é a sua vez.
- Tá bom, tá bom, não precisa ficar nervosinho. Por onde a gente começa?
- Eu vou pro porão e você fica na cozinha, e vê se não faz barulho.
- Tá legal, mas eu vou dar uma saída antes pra... – quando olha pela janela percebe que a mata está mais perto da casa e vários cipós tomaram a área lima do terreiro.
- Você viu aquilo? Pergunta Alexandre.
- Nosso tempo está se esgotando, vamos logo.
E devagarzinho, eles passam pelas meninas e fazem o combinado. Paulo de posse de uma lanterna tenta não fazer barulho. Procura em todos os cantos, já ia desistindo quando o garoto aparece na janela do porão e diz pra ele.
- Olhe ali no vão do armário, você não olhou lá ainda.
E realmente estava lá. Era um retrato velho já meio amarelado todo dobrado, no verso duas manchas de sangue seco e uma frase “Jamais nos separemos, mesmo após a morte. Selaremos nosso pacto com sangue”, na foto, um casal, uma moça loira e um garoto. O garoto. De novo não. Eles já morreram. Paulo já desconfiava, mas não queria acreditar que estava conversando com um fantasma. Nisso ele ouve barulho de panelas caindo.
“Droga Alexandre, tinha que aprontar”.
Subiu correndo as escadas, e não encontra Alexandre e nem as meninas. Corre para a saída e os encontra pendurados por cipós em um canto da casa. Na frente da porta, impedindo a saída, uma moça. A mesma da foto, só que com expressão mais agressiva. Grita pra ele com uma voz forte e grossa que não condiz com seu aspecto.
-DÊ-ME A FOTO.
- Solte meus amigos primeiro.
- VOCÊ NÃO ESTA EM POSIÇÃO DE EXIGIR NADA. DÊ-ME A FOTO.
Paulo pega um toco de madeira em chamas e aproxima da foto. O fantasma dá um grito.
- NAAAAAAAAAAAAAÃO.
- Já disse solte meus amigos.
- ESTÁ BEM, DEIXAREI ELES IREM.
Os cipós se amolecem e os três são libertados. Eles saem como zumbis sem olharem para trás.
- AGORA ME DÊ A FOTO.
- Deixe-me sair também.
- GAROTO INSOLENTE. NÃO FOI ISSO O COMBINADO.
- Não combinei nada. Qual é o lance desta foto? Porque ela é tão importante?
- ELA ME PRENDE AQUI. JÁ REVIREI A CASA INTEIRA ATRÁS DELA, COMO A ENCONTROU?
- Seu namorado me disse onde estava.
- AQUELE TRAIDOR MISERÁVEL. ACABAREI COM A ALMA DELE QUANDO SAIR DAQUI.
Paulo já estava fora da casa quando vários cipós se enrolaram em seus pés e pernas derrubando-o, fazendo com que a tocha caísse. Ele estava sendo arrastado pra dentro da casa novamente ainda agarrado à foto. Quando a mulher estava preste a pegar a foto o garoto passa correndo e a pega ,jogando junto a tocha. Em instantes o papel escurece se transforma em cinzas. A mulher grita enraivecida.
- NAAAAAAAAAAAAAÃO. – e explode em uma bola de luz branca muito intensa, envolvendo toda a casa em chamas. A explosão lança Paulo à distância.
O garoto se aproxima de Paulo.
- Tudo bem?
- Sim, e você?
- Eu sou um fantasma, lembra?
- É, lembro. O que acontece agora?
- Sigo meu caminho. Obrigado.
- Porque você mesmo não buscou a foto? Vi você pegando ela e jogando-a no fogo.
- Eu não podia entrar na casa, e ela não podia sair. E isso só foi possível porque você pode me ver, e com a foto destruída, o pacto de sangue foi rompido. A entidade da casa a libertou agora. Vá, seus amigos logo sairão do transe.
Paulo olha por sobre o ombro do garoto e vê a menina da foto sorrindo pra ele.
- Agora tenho que ir meu amigo, seu nome será lembrado em nosso meio.
O garoto dá as costas e de mãos dadas com a menina vão caminhando e se desmaterializando.
Alexandre de repente desperta, juntamente com as meninas.
- O que aconteceu aqui, o que estamos fazendo aqui fora e... Oh Meu Deus, a cabana está em chamas.
- Não sei Xande. Realmente eu não sei.
Espelho...
Enquanto os quatro amigos conversavam na biblioteca, Cybele teve uma idéia.
- Olha gente, tem um feriado na quinta feira, daqui a duas semanas. A gente poderia aproveitar esse, emendamos tudo e só voltamos na segunda, que tal?
- Pra mim está ótimo – emendou Angélica.
- E o local? Perguntou Paulo.
- Isso deixa comigo. – completou Alexandre.
- Então tá, tá combinado – confirmou Cybele.
- Olha lá, pra onde você vai levar a gente. – disse Paulo.
- Ih, tá com medinho é? – disse Alexandre em tom de gozação.
- É claro que não, mas segurança em primeiro lugar.
- Já disse, não esquenta, vou arrumar um lugar legal.
- Deixem de conversinha e vamos, temos aula daqui a pouco. – disse Angélica.
***
Um dia antes, se encontraram para acertar os detalhes.
- Então pessoal, levem pouca coisa, quanto à comida, evitem os enlatados, pois fazem muito peso. – disse Alexandre.
- E para onde nós vamos? – quis saber Angélica.
- Vamos para uma cidade chamada Torre de Pedra, eu a achei no “Google Earth”. Lá, como o nome já diz, tem uma torre de pedra de formação natural. Fica bem afastada da cidade e na base da torre tem um barraco que era usado por caçadores, mas ninguém usa mais.
- E a que horas vamos sair? – perguntou Cybele.
- 06 horas.
- Hei Paulo. Volta pra Terra. – gritou Alexandre em tom de gozação.
- Hã? Pra mim, tudo bem.
Mas não estava tudo bem. Alguma coisa lhe dizia que aquilo não era uma boa idéia. E ele havia aprendido a respeitar sua voz interior.
Como certa vez, que ele trabalhava em uma serraria. Era um trabalho até fácil. Só tinha que engatar dois ganchos um de cada lado das toras, que estavam ligados a uma corrente que por sua vez, era içado através de um controle remoto. Como o cabo do controle era curto, Paulo tinha que acompanhar a tora de bem perto até a serra. Foi numa dessas que Paulo ouviu a voz:
“Pisa na outra tora” – ouviu na sua cabeça.
Parou todo sistema e olhou para traz, para os lados e não viu ninguém, achou que estava ouvindo coisas, voltou a acionar a máquina e novamente a voz, desta vez mais forte e imperiosa.
“PISE NA OUTRA TORA”
Desta vez foi tão forte que ele resolveu obedecer. No mesmo instante, ele ouviu um barulho de tecido rasgando. Eram os ganchos que prendiam a tora no ar que estavam escapando para, logo em seguida, cair exatamente onde ele estava. Depois disso, sempre prestava atenção em sua voz interior.
****
Saíram bem cedo, estava começando a clarear, ouviam e cantavam junto uma música dos Engenheiros do Hawaii, “... nem tão longe que eu não possa ver, nem tão perto que eu possa tocar...”, A montanha era o título da música, muito apropriado para o destino deles.
Já estavam na rodovia Castelo Branco quando bateu aquela fome.
Puxa vida, eu estou como uma fome, a última vez que tomei café da manhã foi ontem. – disse Paulo e todos deram risadas.
- Daqui a pouco a gente chega no Castelinho da Pamonha. Dá pra comer uns salgados e ir ao banheiro. – disse Alexandre
Após comerem, seguiram viagem, não demorou muito e já chegaram na saída de acesso à cidade.
- Bom, - disse Alexandre – agora a gente entra aqui e pergunta lá na cidade.
- Como assim “pergunta lá na cidade?” Você não disse que viu lá no mapa do Google? Disparou Cybele.
- É que... – começou a gaguejar Alexandre – Bem, é que no mapa estava visível só até aqui e na cidade. Na área da torre não aparece nas fotos do satélite, é como se ele não cobrisse esse pedaço.
- Muito engraçadinho não é seu Alexandre – reclamou Angélica.
Paulo começou a ficar inquieto com as novidades e aquela sensação estranha voltou a perturbá-lo novamente. Ele dizia pra si mesmo que aquele era seu “sentido de aranha”, igual ao filme.
****
A cidade era bem afastada da rodovia, mas foi fácil chegar lá. Depois de algumas perguntas, acharam o caminho para a tão falada Torre de Pedra.
Chegaram em um ponto em que o terreno era muito ruim e íngreme. Pararam em uma casa simples e perguntaram se tinha outra entrada.
- Tem não senhor. – respondeu o morador – é melhor vocês deixarem o carro aqui e seguirem viagem a pé.
- Fica longe?
- Dá uns 5 km de subida, depois fica planinho.
- Obrigado.
- Di nada. Vocês vão ficar na cabana do “véio Osmar?”
- Não sei se é a do “velho Osmar”, mas é isso aí. Ela tá abandonada, não é?
- É sim, à noite, fechem bem as portas e as janelas.
- Porque? – interveio Cybele.
- Ué porque? Pra mós dos bichos não entrá.
Angélica olhava Alexandre fuzilando-o com os olhos.
- Bom turma, ouviram o homem, peguem as mochilas e vamos. 5 km de subida vai levar pelo menos uma hora.
Os quatro acenaram para o homem, viraram as costas e se puseram a caminhar, nem perceberam que o homem balançava a cabeça em sinal negativo e se benzia, fazendo o sinal da cruz duas vezes.
Alexandre seguia na frente, em seguida Cybele, Angélica e Paulo fechando a fila.
Andaram vinte minutos e já estavam exaustos. Fizeram uma parada para descansar e tomar água. Prosseguiram a caminhada até chegarem na área plana, já dava pra ver a torre de pedra e a cabana. Já eram quase duas horas da tarde, mas decidiram parar para comer só quando chegassem na cabana. Quando chegaram, os rapazes saíram para catar lenha pra a lareira e para cozinhar, enquanto as moças ficaram preparando os utensílios para o almoço e a janta, que seria no máximo macarrão instantâneo e lingüiça defumada.
Deram uma volta à tarde, tinha um laguinho ali perto, mas nem pensaram em mergulhar, ali em cima fazia muito frio.
Paulo e Alexandre ficaram felizes por terem pegado bastante lenha, manteria a cabana aquecida. A noite chegou rápido e uma forte neblina começou a se formar e decidiram voltar para a cabana.
No caminho de volta à cabana seguiram a mesma formação da subida. Paulo como vinha atrás, ouviu um barulho às suas costas, quando se virou deu de cara com um garoto. Tinha mais ou menos 15 anos.
- Quem é você? Você mora por aqui?
O garoto, assustado com as perguntas, sai correndo e some em meio às árvores e a neblina.
- Hei! Espera aí.
- Estamos esperando. – gritou Angélica, já meio distante.
- Tinha um garoto aqui. – disse Paulo, meio ofegante.
- É. E quem era?
- Não sei. Quando perguntei o nome dele, ele saiu correndo.
- Deve morar por aqui e está curioso por ter alguém morando na cabana. Vamos logo, porque do jeito que está essa neblina, daqui a pouco a gente não acha nem a cabana.
Segundo as orientações do morador que ensinou o caminho, fecharam bem as portas e janelas.
Como estavam cansados dormiram profundamente. Fizeram um semicírculo em volta da lareira para se manterem aquecidos à noite. De madrugada, Paulo ouvira uma voz de mulher chamando seu nome, levantou e reparou que as meninas ainda dormiam, resolveu levantar e dar uma olhada lá fora e pensou ter visto o garoto novamente em meio à neblina que agora era bem mais densa.
No dia seguinte, Paulo percebe que Cybele e Angélica estão com um comportamento estranho, fazem de tudo pra que ele e Alexandre não saem de casa, inventam um monte de coisa para fazer e com insinuações acabam conseguindo. No final da tarde, Paulo aproveita um momento de distração das duas e sai da cabana pra dar uma volta e encontra o garoto um pouco distante da cabana, corre até ele e pergunta:
- O que você quer?
- Vocês têm que sair daqui.
- Porque?
- Por que é perigoso, vocês não deviam estar aqui, ela não vai deixar vocês irem.
- Ela quem?
- Não posso falar mais nada, ela não pode saber que falei com você.
- Ela quem? Espera aí.
O garoto corre novamente e grita antes de desaparecer atrás de uma árvore.
- Procure o retrato e destrua.
Paulo ficou meio assustado. Depois do episódio no parque de diversões, tem receio conversar com pessoas isoladamente.
Ao voltar para a cabana Alexandre está discutindo com as meninas.
- Porque temos que arrumar essa cabana? Ela nem é nossa e vamos embora depois de amanhã?
- É só pra ficar mais agradável. – disse Cybele em tom meloso.
- E você? Onde esteve?
- Fui dar uma volta.
- Venha tenho umas coisas pra você fazer.
- Não podemos fazer amanhã? Já está tarde.
- Tudo bem então. Mas nada de escapadinhas hein?
Todos jantam e se deitam, pois estão muito cansados. Paulo finge dormir e quando reina o silêncio, levanta e dá um cutucão em Alexandre tampando-lhe a boca e faz sinal pra que ele fique quietinho. Vão até a janela e Paulo fala quase sussurrando.
- Temos que sair daqui.
- Eu sei, eu tentei isso o dia todo.
- Não, você não entendeu, temos que dar o fora, puxar o carro.
- É, você tem razão. Isso não é o fim de semana que eu planejei, to só trabalhando.
- Temos que achar uma coisa antes.
- O que?
- Um retrato.
- Pra quê?
- Olha xande, eu vim até aqui com você sem fazer perguntas, é agora é a sua vez.
- Tá bom, tá bom, não precisa ficar nervosinho. Por onde a gente começa?
- Eu vou pro porão e você fica na cozinha, e vê se não faz barulho.
- Tá legal, mas eu vou dar uma saída antes pra... – quando olha pela janela percebe que a mata está mais perto da casa e vários cipós tomaram a área lima do terreiro.
- Você viu aquilo? Pergunta Alexandre.
- Nosso tempo está se esgotando, vamos logo.
E devagarzinho, eles passam pelas meninas e fazem o combinado. Paulo de posse de uma lanterna tenta não fazer barulho. Procura em todos os cantos, já ia desistindo quando o garoto aparece na janela do porão e diz pra ele.
- Olhe ali no vão do armário, você não olhou lá ainda.
E realmente estava lá. Era um retrato velho já meio amarelado todo dobrado, no verso duas manchas de sangue seco e uma frase “Jamais nos separemos, mesmo após a morte. Selaremos nosso pacto com sangue”, na foto, um casal, uma moça loira e um garoto. O garoto. De novo não. Eles já morreram. Paulo já desconfiava, mas não queria acreditar que estava conversando com um fantasma. Nisso ele ouve barulho de panelas caindo.
“Droga Alexandre, tinha que aprontar”.
Subiu correndo as escadas, e não encontra Alexandre e nem as meninas. Corre para a saída e os encontra pendurados por cipós em um canto da casa. Na frente da porta, impedindo a saída, uma moça. A mesma da foto, só que com expressão mais agressiva. Grita pra ele com uma voz forte e grossa que não condiz com seu aspecto.
-DÊ-ME A FOTO.
- Solte meus amigos primeiro.
- VOCÊ NÃO ESTA EM POSIÇÃO DE EXIGIR NADA. DÊ-ME A FOTO.
Paulo pega um toco de madeira em chamas e aproxima da foto. O fantasma dá um grito.
- NAAAAAAAAAAAAAÃO.
- Já disse solte meus amigos.
- ESTÁ BEM, DEIXAREI ELES IREM.
Os cipós se amolecem e os três são libertados. Eles saem como zumbis sem olharem para trás.
- AGORA ME DÊ A FOTO.
- Deixe-me sair também.
- GAROTO INSOLENTE. NÃO FOI ISSO O COMBINADO.
- Não combinei nada. Qual é o lance desta foto? Porque ela é tão importante?
- ELA ME PRENDE AQUI. JÁ REVIREI A CASA INTEIRA ATRÁS DELA, COMO A ENCONTROU?
- Seu namorado me disse onde estava.
- AQUELE TRAIDOR MISERÁVEL. ACABAREI COM A ALMA DELE QUANDO SAIR DAQUI.
Paulo já estava fora da casa quando vários cipós se enrolaram em seus pés e pernas derrubando-o, fazendo com que a tocha caísse. Ele estava sendo arrastado pra dentro da casa novamente ainda agarrado à foto. Quando a mulher estava preste a pegar a foto o garoto passa correndo e a pega ,jogando junto a tocha. Em instantes o papel escurece se transforma em cinzas. A mulher grita enraivecida.
- NAAAAAAAAAAAAAÃO. – e explode em uma bola de luz branca muito intensa, envolvendo toda a casa em chamas. A explosão lança Paulo à distância.
O garoto se aproxima de Paulo.
- Tudo bem?
- Sim, e você?
- Eu sou um fantasma, lembra?
- É, lembro. O que acontece agora?
- Sigo meu caminho. Obrigado.
- Porque você mesmo não buscou a foto? Vi você pegando ela e jogando-a no fogo.
- Eu não podia entrar na casa, e ela não podia sair. E isso só foi possível porque você pode me ver, e com a foto destruída, o pacto de sangue foi rompido. A entidade da casa a libertou agora. Vá, seus amigos logo sairão do transe.
Paulo olha por sobre o ombro do garoto e vê a menina da foto sorrindo pra ele.
- Agora tenho que ir meu amigo, seu nome será lembrado em nosso meio.
O garoto dá as costas e de mãos dadas com a menina vão caminhando e se desmaterializando.
Alexandre de repente desperta, juntamente com as meninas.
- O que aconteceu aqui, o que estamos fazendo aqui fora e... Oh Meu Deus, a cabana está em chamas.
- Não sei Xande. Realmente eu não sei.
Espelho...
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